Friday, October 08, 2010

Versos otimistas como não sei fazer

Para Maria Eduarda
Hei, eu a chamei,
você me viu,
eu lhe mostrei, você abriu,
dei um livro e um abraço,
"A Conquista do Espaço".
Mas não me satisfaço:
Faço-lhe mapas e traços,
corto papéis em pedaços,
brincamos e imaginamos
e nesses descompassos
nós nos entrosamos.
Lembro como se fosse agora,
quando, onde você ainda mora,
brincávamos até cansar,
e íamos até o mar
contar, na praia, histórias
criando ritos e glórias
nas margens do oceano
que era nosso cotidiano.
A praia ficou para trás,
pois já não a levo mais;
fico na tola esperança
de que essa vaga lembrança
supra a minha vontade
de ir matar a saudade
de visitá-la e de levá-la
sem quaisquer troços ou malas
praqueles longos passeios.
Mas é que agora, creio,
não posso mais fazer nada,
por você, minha afilhada;
porque estamos tão distantes,
diferente de como era antes,
que já não posso acolhê-la,
espero apenas poder vê-la
porque às vezes a tristeza
nos deixa sem qualquer defesa.
Mas não estou triste, prometo,
tenho em você um amuleto
que recheia minha memória,
que dá sentido à minha história,
que melhora um pouco tudo isso
é uma espécie de compromisso.
E desde quando eu nasci,
só agora de fato entendi
que em tudo reside uma lógica;
eu tenho enfim sobrevivido
tenho buscado algum sentido
que ainda não encontrei,
mas ainda assim eu sei
o que você sequer imagina:
mesmo que haja um caminho certo
essa busca nunca termina.

Friday, October 01, 2010

Para a margem oposta do rio

Na margem oposta do rio
não há sonhos ou esperanças,
não há bichos e nem crianças;
naquele lugar toda quimera
são mostras de que coisas boas
não satisfaziam pois não existiam
senão noutro tempo, noutra era.


Na margem oposta do rio
não vemos garotas, não temos desejos,
não temos abraços, não temos beijos;
temos o bocejo que marca o cansaço
de quem, numa simplória expectativa
imprime ali o seu derradeiro passo,
a sua última e fracassada tentativa.


Porque a margem oposta do rio,
para quem observa do lado de cá,
oferece loas de primaveras e luzes,
mas esconde a negritude e as cruzes
que nos apresentam a sua outra face
deixando-nos num verdadeiro impasse
(é por isso que não há mais ninguém lá).


Na margem oposta do rio, disseram poetas
as estátuas esculpidas substituíram os atletas,
a paisagem verdejante, com vida e com cor
se transformou numa natureza morta pela dor.
E é por amor à dor e ao sofrimento de agora
que é pra lá que vou quando daqui for-me embora.


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